Fêmea de Culex quinquefasciatus sugando sobre a pele humana. Foto: Sandra Nagaki, SP

terça-feira, 1 de março de 2016

Carta de um morador preocupado com o Aedes aegypti em sua cidade


RECEBI UM EMAIL DO SR VALDIR, O QUAL ESTÁ PREOCUPADO COM OS MOSQUITOS EM SUA CIDADE. AQUI, EU COLOCO A MINHA OPINIÃO SOBRE AS POSSIVEIS CAUSAS DO AUMENTO DO AEDES AEGYPTI NAS CIDADES E ALGUMAS SUGESTÕES PARA UM CONTROLE MAIS EFETIVO DESSA POPULAÇÃO DE VETORES.
                                                      
Valdir Oliveira de Teófilo Otoni MG 

Prezada Dra. Sirlei Morais, 

Já nos comunicamos outras vezes, e sempre procuro me atualizar com novidades no seu blog. Passa ano e vem ano, o mosquito nunca some aqui de casa. De noite, as muriçocas "inofensivas". De dia, o terrível que veio do Egito. Os terríveis atacam entre 16h e 20h, e entre 6h e 9h. Não provei se atacam no alto da noite. As muriçocas começam a ronda por volta das 21h. Acho que as espécies se encontram entre 20h e 21h, para a troca de ronda. Aqui vale a regra: aonde tem muriçoca, tem Aedes. Se tem isso tudo, há um antigo berçário deles bem pertinho daqui. E entenda uma coisa, quando falo que tem mosquitos, é que tem muitos. São fáceis de ver. Sugam o nosso sangue e nem se preocupam em voar quando a gente balança o corpo. Domesticaram. O curioso é que na minha casa, sem descartar nenhuma possibilidade de ter, visivelmente, não há sinais de ter focos, mas tem terrenos vazios ao redor. Mais curioso ainda é que há anos o pessoal da "Sucam" passa pela região, e sempre dão laudo de que não encontrou foco. Então, no momento, antes de escurecer, fico ao redor da minha casa tentando achar de onde os terríveis vêm voando, mas por enquanto sem sucesso. Eu acho que há um berçário principal nas redondezas. Como a minha rua é uma ladeira, há casas acima do nível da minha, então, podem vir por cima. Também, estou fazendo uma tela em forma de alçapão (coisa da roça) para colocar na boca do ralo das águas pluviais aqui de casa, para eliminar qualquer possibilidade de ter foco dentro de casa. Com o alçapão, imagino que os "bichinhos" vão ficar presos ao deixar a vida anfíbia. E sabe quem mais veio para a festa? Os flebótomos. Estão dizimando os cachorros da cidade. Mas, isso é outra história. Escrevo apenas para relatar, e quem sabe obter alguma ideia de como localizar os berçários, ajudando a "Sucam". Muito obrigado pelos diálogos. 

Prezado Sr Valdir, agradeço a sua contribuição para este canal de comunicação on line. 

Algumas características do local contribuem para a presença de mosquitos: Eu pesquisei sobre sua cidade, Teófilo Otoni, e constatei que é rota de viajantes do Sul para o Nordeste e rota para as belas e disputadas praias do Sul da Bahia pela BR418. É ainda cortada pela BR116, como rota de caminhões que levam mercadorias para o Nordeste. Esse fluxo de mercadorias e pessoas eleva a cidade como local de alto risco para a entrada de mosquitos e agentes de doenças. Somado a isto, existem outros fatores preponderantes para a proliferação dos mosquitos, como o clima quente o ano todo, umidade, chuva, e ainda a cidade ser cercada pela mata atlântica e esta pressionada pelo desmatamento. O senhor mesmo me passou outras características da cidade que também contribuem,  como o fato desta ter baixa altitude e ser montanhosa. Pois, com a chuva, a lama escorre das construções nos morros, entupindo a rede pluvial na parte baixa da cidade. A lama e a água secam na superfície, podendo a água ficar represada dentro da rede pluvial subterrânea. O rio que corta a cidade é poluído pelo esgoto residencial. Em alguns bairros periféricos há pequenos córregos que

viraram esgoto a céu aberto. No geral, não tem valas específicas para água da chuva a céu aberto.Têm valas subterrâneas.

Minha análise: Como a maioria das cidades no Brasil, Teófilo Otoni segue como favorável a introdução e expansão de mosquitos vetores. O controle dessa população de mosquitos deve ser integrado com medidas cautelares de obras de infraestrutura urbana. Em uma comunidade, as águas devem ter um sistema de fluxo tal que não possibilite ser represada, mesmo que por pouco tempo. Os terrenos não devem ter buracos, mato e muito menos lixo. Pois tudo isso contribui para a proliferação dos mosquitos. Já temos a questão do comportamento e da própria cultura das pessoas em armazenar água e ter vasos de plantas. Mas é ingenuidade pensar que somente isso causa uma superpopulação de mosquitos. Outros fatores ambientais como o desmatamento que causa superaquecimento, a falta de infraestrutura urbana e a aglomeração populacional em locais de periferia com baixa qualidade de vida e ainda a falta de investimento do governo em ações comunitárias contribui na maior parcela para a questão do aumento descontrolado dos mosquitos. Um programa de controle de mosquitos vetores deve levar em conta as questões de governabilidade como um todo e não isoladamente, com panfletagem para o povo se ‘conscientizar’. Se conscientizar do quê? A questão é mais ampla e envolve a qualidade de vida, a questão econômica e social como um todo. Também de nada adianta retirar todos os criadouros, sem a implantação de um sistema de monitoramento da população de mosquitos. Pois a fêmea, não encontrando local para pôr os ovos, tende a utilizar os seus mecanismos de sobrevivência alternativos, evoluindo para novas paragens. Nesse caso, após a eliminação dos mosquitos e dos seus criadouros, devem-se ter armadilhas de oviposição para a captura das fêmeas e de suas proles, com o devido monitoramento. O controle deve ser de ‘supressão’ dessa população que antes infortunadamente teve seu desenvolvimento de maneira livre, desassistida e desordenada.

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